Estourando
de excitação, Leandro e Davi correram
atravessando o quintal em direção à trilha, ignorando as pilhas de restos de
artilharia e trincheiras individuais, lembranças ruins da Segunda Guerra
Mundial.
“Tchau,
mãe”, disseram e acenaram pela última vez, antes de desaparecerem dentro da
mata.
A mamãe
confiou que Zai Kom, o zelador do acampamento da missão, iria cuidar de seus
filhos, enquanto sussurrava uma oração: “Cuida deles, querido Deus”.
O pai de
Leandro e Davi tinha saido em uma viagem missionária, para uma parte isolada e
solitária da Birmânia. Os meninos estavam indo para encontrar-se com ele na
pequena vila de Lai Twi aquela noite.
Os
meninos e o zelador fizeram seu caminho ao longo de atalhos estreitos e cheios
de precipícios, caminhos que pareciam uma cobra se retorcendo por entre grandes
árvores e pequenos arbustos. A luz do sol, filtrada pelas árvores, fazia
desenhos de luz que dançavam sobre os cabelos louros dos meninos. Em muitos lugares
os meninos apontavam para árvores com delicadas orquídeas crescendo em seu
tronco – algumas amarelas e violeta, entre
muitas brancas como a neve.
“Estamos
perto do rio”, disse Leandro, depois de algum tempo.
“Que bom.
O velho Manipur não é muito fundo, podemos atravessar sem dificuldade”, disse
Davi. Os três atravessaram facilmente o rio e depois pararam um pouco do outro
lado para descansar, antes de começar a subida que levava a Lai Twin.
O coração
de Leandro palpitava forte na subida, e ele começou a ficar para trás. “Estamos
quase chegando?”, perguntou ansiosamente.
“Logo
depois da próxima curva”, respondeu Zai Kom, “mais uns minutos e estaremos lá”.
“Até que
enfim!” Gritou Leandro, subindo rapidamente pelo caminho e esquecendo que suas
pernas estavam cansadas. Podia ouvir ruídos
do vento soprando através das árvores. Agora Leandro estava bem na
frente de Davi e Zai Kom. Já podia sentir o cheiro peculiar de uma vila
birmanesa, e em poucos minutos chegou à vila.
Enquanto
esperava que os outros chegassem, ficou observando os sinais comuns de uma vila
pagã. Sempre ficava com medo quando via as ofertas que faziam aos espíritos nos
postes do lado de fora das casas. Ali estava a cabeça de um cachorro, sua boca
curiosamente aberta com palitos e depois enchida com comida. Como estava feliz
por ser cristão, e também porque a sede da missão ficava em uma vila cristã.
Além do
poste, a casa tinha o telhado feito de palha, e muitas casas tinham inkas
(varanda, pórtico) com tutpas. Um tutpa é um banquinho baixo, geralmente
enfeitado com pele de tigre. As casas eram construídas contra a montanha e do
outro lado sustentadas por pilares. Embaixo das casas os porcos grunhiam.
“Ugh! Olhe
que sacrifício horrível naquele poste”, disse Leandro torcendo seu nariz, logo
que Davi chegou perto dele.
“Realmente
é horrível”, Davi concordou, franzindo seu nariz, “mas venha, temos de chegar
na casa dak, passaremos a noite ali. O papai deve chegar logo”.
Uma curta
distância à frente, eles encontraram o “hotel” mantido pelo governo e que era
conhecido por dak. Era um pouco melhor do que uma choupana, mas tinha paredes
quebradas, colunas que balançavam e um inka (entrada) sujo.
Bem
depressa os meninos se ocuparam fazendo fogo, e cozinhando arroz para o jantar.
Leandro e Davi não deram atenção aos moradores da vila que vieram para observá-los. Mas quando as
pessoas começaram a apontar, falar e rir excitadamente, os meninos sabiam que
alguém estava chegando.
“Deve ser
o papai”, exclamou Davi, e começou a ir para a entrada.
“É o
papai! É o papai”, ele gritou enquanto corria para os braços do pai. Leandro
seguiu bem de perto.
“Como
estão vocês?”, perguntou o pai em voz profunda, enquanto abraçava Davi e
Leandro. Depois, mais depressa que puderam passaram pelas pessoas e entraram na
choupana para comer o seu jantar.
Não
tiveram tempo de conversar depois do jantar, porque os moradores da vila se
amontoaram ao redor, trazendo seus doentes. O pai deu medicamento, tratou e
ajudou em tudo que pôde. Depois começou a falar para as pessoas sobre Jesus,
que os amava.
Finalmente
as pessoas voltaram para suas casas, e o papai, deitou para descansar.
Durante a
noite caiu uma chuva muito forte. Choveu durante toda à noite. De manhã, a trilha
tinha sido lavada e apagada em muitos
lugares, e o caminho estava muito escorregadio.
O pai
conversou com os carregadores sobre a situação. Com uma chuva tão forte e
pesada, o Rio Manipur deveria estar transbordando. Será que deveriam seguir
aquele caminho, ou deveriam tomar um caminho mais longo, que demorava mais de
um dia para encontrar a ponte? Ao final, todos
concordaram que deveriam descer a montanha e enfrentar o rio.
Escorregando aqui e ali, desceram a trilha até o rio. Quando alcançaram
o rio, ficaram todos atolados.
“O rio
cresceu mais depressa do que uma massa de pão em uma cozinha quentinha”, disse
Zai Kom. A água fazia redemoinhos e muita espuma na borda.
“O rio
deve estar com mais de 160 metros de largura”, observou o papai. “Vamos
precisar muito da ajuda de Deus para poder atravessar o velho Manipur hoje”. E
virando para Zai Kom, disse: “Corte uma vara bem comprida de bambu. Todos
devemos nos segurar nesta vara para cruzar o rio, se alguém cair, poderemos
ajudá-lo a levantar-se”. O papai olhou ao redor para Zai Kom, Leandro e Davi, e
para os carregadores. Leandro e Davi estavam tão excitados que não tinham tempo
para sentir medo.
Logo que a
vara estava pronta, o papai pediu que todos curvassem a cabeça para uma oração:
“Pai Nosso que estás no Céu, cuida de nós enquanto atravessamos o rio,
ajuda-nos a ter pés firmes, e que possamos chegar salvos até a outra margem.
Pedimos em nome de Jesus. Amém”.
Zai Kom
foi o primeiro a entrar na água agitada, depois Leandro, o Papai, Davi e os
carregadores seguiram, segurando na vara de bambu.
Leandro
andou alguns passos e logo começou a escorregar. “As pedras estão muito lisas!
Quase não posso ficar em pé!”, ele gritou.
“Segure
bem firme”, acrescentou o pai, mas o barulho da correnteza impossibilitou que
os outros ouvissem.
A água
agitada empurrava e retorcia seus corpos. E começou a ficar mais fundo, e mais
fundo – a água chegou primeiro até os joelhos, depois na cintura e até o peito.
Os carregadores lutavam para manter o equilíbrio, com os pacotes sobre suas
cabeças.
Leandro já
estava sentindo a água em sua boca e nariz. Quando seu pé pisou em uma pedra
grande, ele deu um impulso e por um momento conseguiu tirar sua cabeça e seu
peito de dentro da água para respirar, mas em seguida seu corpo desapareceu na
água funda novamente. Ele esticava as pernas, tentando pisar no fundo, quando
uma de suas mãos escapou da vara. A turbulência do rio o sacudiu com tanta
força, que conseguiu fazer com que sua outra mão se soltasse da vara de bambu,
e por isto submergiu completamente e começou a ser arrastado rio abaixo. Mas
seu pai que viu o que estava acontecendo, mergulhou na revoltosa água e
conseguiu encontrar Leandro. O menino sentiu os fortes braços do pai puxando-o
de volta. Novamente conseguiu se segurar na vara e depois sentiu as mãos de seu
pai cobrindo suas mãos, enquanto segurava firme na vara de bambu. Depois
desse acontecimento, que pareceu uma
eternidade para Leandro, a pequena comitiva conseguiu alcançar o outro lado do
rio.
Leandro olhou para o rosto de seu pai e
disse: “Estou muito feliz porque os anjos cuidaram de nós, papai, e também
estou feliz por você ter segurado a minha mão”. Viu quando o rosto de seu pai
se transformou em sorriso. Leandro agora sabia um pouco mais sobre o amor de
seu Pai Celestial e também sobre Sua proteção.
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