Durante a guerra, grandes aviões com sua carga
mortal sobrevoaram a Áustria. Milhares de casas foram destruídas, fábricas
incendiadas e a Capital passou por grande aflição. Inúmeras famílias foram deixadas sem lar, como só
acontece quando há guerra. Gene e Maria chamemo-los assim, voltaram um dia da
escola para casa apenas para descobrir que não somente a casa tinha sido
destruída pelas bombas, mas tanto o pai como a mãe haviam sido mortos. Os
vizinhos os levaram, com muitas outras crianças sem lar, para o grande orfanato
da cidade. Bem podemos imaginar a tristeza e a amargura daquelas pobres
crianças. Contudo, não esqueceram os ensinamentos dos pais e muitas vezes ao encontrarem-se
no vestíbulo do orfanato, cruzavam as mãozinhas e oravam ao Pai celeste. Não
sabiam o que o futuro lhes reservaria.
Um dia foi
anunciado que um país vizinho se oferecia para arranjar lares para muitas
daquelas crianças. Todos estavam excitados e felizes no dia da partida. Gene e
Maria saíram felizes com seus poucos pertences debaixo do braço e entraram no
ônibus que os havia de levar até a estação, onde tomariam o longo trem
sibilante. Seria sua primeira viagem de trem. Centenas de crianças seriam
levadas da pátria para um país estranho, onde deveriam encontrar novos lares –
novos papais e novas mamães.
Quando
soou o apito, o trem começou a movimentar-se, ganhando velocidade. Logo cortava
os campos com rapidez enquanto ansiosos olhinhos perscrutavam cenários que
nunca seriam esquecidos. Gene e Maria, contudo, não estavam demasiado ocupados
para poderem cruzar de vez em quando as mãozinhas e curvar as cabecinhas para
uma oração: “Querido Jesus, Tu sabes que perdemos nosso papai e nossa mamãe:
dá-nos, por favor, um novo lar. Não permitas que sejamos separados e envia-nos
para o lar conveniente”.
Logo o
trem diminuiu a velocidade e parou numa estação. Crianças e mais crianças
emergiram dos superlotados carros e fizeram filas na plataforma. Muita gente da
cidade ali estava, a fim de escolher uma criança e adotá-la. Aqui e ali uma era
escolhida por ansiosos casais que fitavam aqueles orfãozinhos de um país
estranho. Aqueles rostinhos tristes se voltavam para cima para verem seus novos
pais. Os que sobravam voltavam para o trem e viajavam para a próxima cidade.
O dia
inteiro repetiu-se a cena, enquanto o grande trem, hora após hora carregava
aqueles pedacinhos da humanidade para novas aventuras. De quando em quando Gene
e Maria repetiam a oração para que de qualquer maneira Deus encontrasse para
eles o devido lar.
Estava
quase escuro quando o trem parou outra vez numa grande estação. Gene e Maria
separavam-se ao descerem do trem para a fila, onde, conforme pensavam seriam
passados por alto, como tantas vezes já havia acontecido antes.
Essa
manhã, em certa cidade, um casal adventista do sétimo dia estava fazendo o
culto quando uma batida na porta anunciou a chegada do jornal matutino. Depois
de terminado o culto passaram os olhos pelo jornal para lerem as manchetes:
“Trem de crianças austríacas chega esta noite”, foi o que lhes atraiu a
atenção. A bondosa senhora olhou para o marido e disse: “Querido, esta é a
nossa oportunidade de conseguirmos o menino que há tanto tempo você deseja”.
O marido
respondeu com um sorriso: “Não, querida, você sempre desejou uma menina e não
quero ser egoísta. Enquanto vou trabalhar, você vai à estação e, quando o trem
chegar, escolha uma linda menina de cabelos crespos, para nós”.
Por algum
tempo estiveram considerando se devia ser menino ou menina. De uma coisa
estavam convictos: que só poderiam cuidar de uma criança. Existia no coração de
ambos uma simpatia especial pelos austríacos, pois ambos tinham parentes na
Áustria. Finalmente chegaram á conclusão de que adotariam um menininho que
tivesse cabelos crespos, ombros largos e se parecesse com o pai adotivo.
Quando o
trem parou em sua cidade aquela noitinha e as centenas de crianças fizeram fila
para procurar novos pais, a Sra. Bergman estava lá. Andou avidamente de um lado
para o outro, contemplando os rostinhos magros e tristes das pequenas vítimas
da guerra. Podia ler a história de desapontamento, desolação e fome em muitas
faces. Afinal notou um rapazinho que parecia ter as feições procuradas, ombros
largos, cabelos crespos e ar tranqüilo e calmo. Havia algo nele que atraiu a
atenção. Parecia-se com alguém que ele já tinha visto antes. Aproximou-se dele
com um sorriso:
Você quer
vir para a nossa casa? Temos um balanço no quintal e nenhuma criança para
brincar nele. Eu gosto de homenzinho como você. Você vem comigo?
Gene
continuou ereto e impassível. Afinal respondeu com sua vozinha fina:
- Sim, eu
gostaria de ir com a senhora e brincar no balanço, mas tenho uma irmãzinha e
queremos ficar juntos.
Sua
vozinha tremeu um pouco na última palavra e lágrimas brilharam nos olhos.
- Oh, mas
sua irmãzinha terá acolhida em outra parte! Nós só podemos ficar com um, rogou
a Sra. Bergman.
- Mas nós
pedimos a Jesus que nos mandasse para a mesma casa e temos certeza de que Ele
terá um lugar onde poderemos ficar juntos, pois perdemos nosso pai e nossa mãe,
disse o pequeno, num soluço.
O coração
da senhora ficou tocado. Ali estava um menino que cria em Deus e cria que Ele
havia de responder à sua oração. Respondeu rapidamente: - Onde está sua
irmãzinha? Vá buscá-la, para eu vê-la.
O pequeno
correu, procurando-a na fila, e voltou em seguida com ela pela mão. Ambos
pararam, fitando a bondosa senhora com olhar súplice.
- Aqui
está ela, disse Gene com um sorriso.
Lágrimas
assomaram aos olhos da senhora enquanto sentia um nó na garganta. Que injustiça
estaria praticando ao separar aqueles irmãozinhos, únicos sobreviventes daquela
família destruída pelo bombardeio! Convenceu-se de que devia aceitar os dois.
Olhando-os intensamente, disse: - Bem, queridos amigos, não sei o que meu
marido dirá, mas vou levar vocês dois. Venham comigo e logo chegaremos em casa.
Com
exclamações de alegria eles disseram adeus aos companheiros e logo se perderam
no meio da multidão, seguindo sua nova mãe até o auto lá embaixo, na estação.
Poucos depois estavam sentados na sala de uma boa e ampla casa, esperando algo
para comer.
A Sra.
Bergman estava na cozinha preparando alguma coisa para os famintos aditamentos
de sua família. Com os olhos bem abertos, os pequenos olhavam tudo o que havia
na casa. Realmente estavam contentes de estar nesse novo lar, mas ainda um
pouco receosos do futuro. De repente Gene apontou o dedo magro para o retrato
de uma mulher que estava sobre o piano.
- Veja,
disse ele à Maria, parece...
- Não pôde
continuar, um soluço embargou-lhe a voz e ambos começaram a chorar. Não podiam
controlar as emoções.
Quando a
Sra. Bergman ouviu os soluços, veio correndo para ver o que havia. – Que é que
vocês têm? Que aconteceu? Vocês não estão satisfeitos aqui? Exclamou ela.
- Sim,
disse a menina por entre lágrimas, estamos contentes.
- Então
por que estão chorando tanto? Perguntou ela.
Logo que se acalmaram um pouco, olharam para a face
maternal da Sra. Bergman e apontaram para o quadro sobre o piano. A senhora,
fitando o retrato, disse: - Sim, é minha irmã. Porque vocês choram ao ver essa
fotografia?
A menininha soluçou: - Essa é minha mãe!
Então
a Sra. Bergman concluiu que sua irmã, que fazia anos havia ido para a Áustria e
dela não tinha notícias já havia quatro ou cinco anos, teria sido morta no
bombardeio. Depois de considerável interrogatório, ficou convicta de que estes
eram realmente os filhos de sua irmã.
Oh, que alegria houve naquele lar e que gratidão por
Deus ter ouvido as orações daquelas crianças deixadas sem lar! Compreenderam
que há um Deus que ouve e responde de modo maravilhoso às orações.
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