- Não
emprestarei para ninguém! Exclamou Carlinhos ao ver, na manhã de seu
aniversário, a bela caixa de ferramentas, enviada pelo tio, acompanhada de um
bonito cartão de felicitações. E para maior segurança, acrescentou ele, para
que ninguém me venha pedir nada emprestado, manterei a caixa fechada e
guardarei a chave comigo, no bolso.
- Não se
esqueça, Carlinhos, disse o pai, que você por mais de um ano tem usado
livremente as ferramentas de José. É justo que você seja reconhecido!
Carlinhos
ouviu as palavras mais não claramente, pois já se adiantava quando o pai
começara a falar. Não que ele não
estivesse bem com José, não, eles se davam muito bem. É que no dia anterior,
quando vinham da escola, José havia falado numa carteira escolar que estava
fazendo para a irmãzinha brincar em casa. Ele não podia acabar porque lhe faltava um trado a fim de fazer alguns
buracos nas pernas da carteira.
José
estaria esperando pedir emprestado as ferramentas novas - e, pensou Carlinhos, se eu deixar a caixa
aberta, José sentir-se-á livre para utilizar-se delas. O mais acertado será eu
trazer a caixa sempre fechada e guardar a chave sempre comigo, no “bolso”.
À tardinha
daquele mesmo dia, entretanto, José veio
brincar e Carlinhos observou como ele examinava demoradamente a caixa,
apreciando quão belas e finas eram as brilhantes ferramentas novinhas.
- Que
lindo presente, Carlinhos, disse José tomado de grande entusiasmo. Se
fossem minhas não permitiria que ninguém
tocasse.
- É isso
mesmo que vou fazer. Não emprestarei a ninguém, mas se você quiser fazer algum serviço, eu estarei
disposto a faze-lo para você, respondeu Carlinhos.
- Você tem
a chave da caixa, não tem? Perguntou
José.
-
Certamente, veja, e mostrou a José uma chavezinha de metal branco, brilhante.
Branco e brilhante.
- Muito
bem, isto é suficiente para guardar bem as suas ferramentas, disse José, ao
mesmo tempo em que seu pai o chamava.
- Vamos
passear até o sítio, convidou o papai. Como uma flecha José correu para o
portão, onde estava o pai.
- Você
poderá vir também, disse o pai de José
para Carlinhos.
- Não,
obrigado, respondeu Carlinhos. Preciso fazer umas voltas para mamãe.
- Tudo,
porém o que segurava Carlinhos era a linda caixa de ferramentas. Ele saiu para
fazer algumas compras para a mãe, mas voltou imediatamente. Nunca fizera uma
volta tão depressa. Grande era a animação
pelo presente do tio – a linda caixa de ferramentas brilhantes.
Mas,
quando ele voltou e acabou de fazer alguns outros trabalhos extraordinários
naquela noite, não dispôs de tempo para dar mais uma olhada ao lindo presente.
Demais, ele havia fechado a caixa e a chave estava consigo. Entretanto, para se
cientificar correu a mão ao bolso e para espanto seu a chave não estava.
Estacou, meditando.
“Bem me
lembro agora, disse ele em voz baixa”. José estava com a chave quando seu pai o
chamou. Será que ele me entregou a chave? Não! E Carlinhos convenceu-se de que
José não lhe havia devolvido a chave.
“Malvado
de José!” Murmurou, “mas eu hei de apanhá-lo. Não direi nada a ele que a minha
chave desapareceu até que ele venha e me peça alguma ferramenta emprestada;
então direi que a chave se perdeu”.
Carlinhos
foi dormir aborrecido e na manhã seguinte acordou-se ainda amuado, mas não deu
a menor impressão de que estava aborrecido. Queria demonstrar estar tudo muito
bem.
Quando se
dirigia para a escola viu a José que o esperava no mesmo lugar de sempre,
saudando-o alegremente. Carlinhos nem tirou as mãos do bolso para corresponder
à saudação de José. Este não notou que Carlinhos não lhe correspondeu o aceno
de mão; nem tocou no assunto da caixa de ferramentas que Carlinhos havia
recebido. No período de lanche da escola é que falou a um grupo de companheiros
do lindo presente que Carlinhos ganhara. Nesta hora, Carlinhos se conteve para
não desmascarar a José de ter ficado com a chave da caixa.
O dia de
aulas se passou e Carlinhos não olhou nem uma vez para o lado onde se sentava
José. Quando se acabaram as aulas, Carlinhos adiantou-se para casa, e naquele dia pela primeira vez
não teve palavras de carinho que o veio encontrar como sempre.
Quando
chegou em casa o pai o estava esperando na porta e, tomando a pasta de livros,
pediu-lhe que voltasse ao armazém e trouxesse meio quilo de pregos.
Carlinhos
voltou e no meio do caminho encontrou-se com José, que vinha. Seu primeiro
pensamento foi passar de largo e nem olhar para o amiguinho.
- Vou ao
armazém, quer ir comigo? Foi o que respondeu ao amiguinho que havia perguntou
aonde ia ele.
- Não,
respondeu José, mas vou esperá-lo aqui e
iremos depois juntos para sua casa.
Carlinhos
bem desejaria demorar um pouco mais, até que José desistisse de esperá-lo e então fosse sozinho
para casa. Mas José o esperou.
- Venha e
olhe isto aqui, disse José ao se
aproximar Carlinhos, já de volta, e ambos pararam ao lado de uma grande
construção, observando a estrutura fundamental da mesma.
- Eu olhei
isto ontem à tarde, respondeu Carlinhos, parando para observar.
Num dado
momento o pé de Carlinhos resvalou e o menino caiu, saltando-lhe da mão o
pacote de pregos que espalharam em todas as direções.
- Que
farei, agora? Mais da metade dos pregos caíram pela grade, dentro do bueiro!
Neste
momento a face de José brilhou de satisfação. Parecia estranho José estar
satisfeito neste transe...
- Você tem
aí um cordão?
- Sim,
tenho um barbante, mas que adianta?
-
Certamente que o barbante só não adianta nada, retrucou José, mas olhe aqui, e
desembrulhou alguma coisa.
- Um ímã!
Esplêndido! Onde adquiriu você este ímã?
José
sorriu satisfeito. – Eu o comprei, disse alegremente, para sua caixa de
ferramentas, pois notei que não havia nenhum.
Carlinhos
estava quase para dizer que José estava querendo amenizar a situação de ter
ficado com a chave, mas lembrando-se do propósito que fizera quanto a manter
segredo a respeito da chave, nada falou.
- Pronto,
disse José, depois de haver amarrado o ímã na ponta do barbante. Estou certo de
que reaveremos todos os pregos.
Em poucos
minutos todos os pregos que haviam caído no bueiro estavam em mãos. Na última
vez que ele ergueu o ímã do bueiro, notou que a face de Carlinhos ruboresceu de
satisfação. É que unida ao ímã veio uma chavezinha – a chave da caixa de
Carlinhos.
- Parece a
chave de sua caixa de ferramentas!
- Sim, é a
minha chave mesmo, disse Carlinhos, sem tirar os olhos do amiguinho e
relembrando-se de que na tardinha anterior, ao passar por ali, ouvira um
determinado som metálico, mas não podia imaginar que fosse a chave, e demais
estava com muita pressa para voltar para casa com as compras que fora fazer
para a mãe. Agora ele compreendia que o
som era o de sua chave, quando caíra.
E cheio de emoção falou:
- Ótima
coisa você ter esse ímã neste momento!
- É
verdade, é uma ótima coisa, mas se você não houvesse ganhado a caixa de
ferramentas eu não o compraria, pois o comprei especialmente para a sua caixa
de ferramentas.
- Muito
obrigado, José, disse a Carlinhos emocionado e cheio de gratidão. E
acrescentou: - Quando você desejar
algumas de minhas ferramentas, disponha. A caixa estará sempre aberta!
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